Gótico
Introdução
Desvalorizado enquanto criação artística pelos humanistas da Renascença, defensores dum classicismo italianizante que reviam no Gótico a maniera tedesca (germânica) ou a maniera dei goti (dos bárbaros), esta arte medieval foi reabilitada a partir do século XVIII, emergindo, ainda que com algumas hesitações, das "Trevas" a que estava associada.
Esta arte, que se desenvolve na Europa entre os séculos XII e XV, nasceu na Ilha de França (Paris), na Catedral de Sens (1130-1162) e na Abadia de St. Denis (1130-1144), expandindo-se depois a outras regiões. O abade Suger aparece como o grande mentor da renovação estética e ideológica do Gótico, ao realizar uma série de intenções programáticas em St. Denis, imbuídas do enquadramento escolástico e das interpretações neoplatónicas. Este sistema de pensamento faz-se corresponder numa arte onde o Mistério da Luz teoriza e fundamenta a própria concepção espacial, ao serviço duma fé aglutinadora e poderosa. Trata-se da "estética da elevação espiritual" que este estilo eterniza, mas a sua originalidade não se resume aos princípios ideológicos.
Arquitectura
Durante a época gótica, a arquitectura, simbolizada pela grande Catedral, foi a forma artística que conheceu um maior desenvolvimento técnico e formal. Grande parte das criações escultóricas deste período surgem associadas à arquitectura (normalmente de carácter religioso), sendo aplicadas tanto no exterior como no interior dos edifícios. Procurava em simultâneo exaltar e descrer os textos sagrados, todas as esculturas da Catedral cumpriam um vasto programa narrativo que as transformou num verdadeiro "Livro de Pedra". Para além destas peças escultóricas que integravam as fachadas (caso das representações de anjos e de santos das portas, das figuras fantásticas que formavam as gárgulas, das séries de retratos de reis), ou os interiores das naves, como os capitéis esculpidos, os frisos decorados e os retábulos em pedra, foram igualmente desenvolvidas estátuas de escala mais modesta que se tornaram autónomas relativamente aos organismos arquitectónicos.
Estas esculturas, de pequena dimensão e de temática religiosa, destinavam-se ora às igrejas rurais, ora ao culto privado. A partir dos inícios do século XIII, momento que marcou a ascensão de uma estética mais naturalista e menos estilizada, as estátuas representando a Madonna com o menino constituíram um dos temas preferidos. Estas estátuas, tal como grande parte dos edifícios, eram pintadas.
O mosteiro da Batalha, em Portugal, apresenta um dos mais notáveis conjuntos de estatuária gótica integrada em arquitectura, assim como o grande túmulo de D. João I. Dentro deste género são de referir ainda os túmulos de D. Pedro I e de D. Inês de Castro, colocados no transepto do mosteiro de Alcobaça, que constituem o mais perfeito conjunto escultórico português da época gótica.
Tecnologicamente, o gótico define-se pela utilização concertada do arco ogival e da abóbada de nervuras cruzadas, que permitiram o arrojo de coberturas mais altas (estreitamento dos pilares) e mais leves. O uso de nervuras diagonais introduz a complexificação dos sistemas de suporte - os pilares adensam-se e concentram elementos distintos (colunelos, colunas, pilastras), recebendo a descarga imposta pelas nervuras. As paredes libertam-se das anteriores abóbadas, adelgaçam-se numa quase desmaterialização, à qual não é estranho o emprego de contrafortes exteriores separados dos panos parietais, aos quais se unem por meio de arcobotantes (arcos de descarga). Verifica-se na arquitectura gótica uma acentuada renovação espacial que nos distancia do modelo basilical, sobretudo pela verticalidade.
Os elementos de suporte complexificam-se e alongam-se e as abóbadas de cruzaria conferem unidade ao espaço. As paredes desmultiplicam-se em andares (galerias, trifório), onde a presença da luz natural contribui para a intensificação da mística religiosa. Tudo é linear, proporcional e uno, numa estreita correspondência de partes. O coro desenvolve-se de maneira por vezes excepcional, dando origem à formação de deambulatórios com as respectivas capelas radiantes, favorecendo a aproximação tangencial do crente com o seu Deus. As paredes são ritmadas por amplos janelões que transfiguram a luz através de elaborados vitrais, de vincado carácter narrativo.
A nível da planta consagra-se a adopção do plano em cruz latina, com três naves de altura e largura desiguais e transepto geralmente com três naves, embora pouco saliente.
As fachadas concentram dois elementos-chave do Gótico - o portal e a rosácea (alude ao sol como símbolo de Cristo e à rosa como símbolo de Maria) -, rivalizando entre si nas dimensões e enriquecimento escultórico.
Artes plásticas e decorativas
Na época gótica abandonou-se a tendência para pintar o interior das igrejas com os grandes ciclos narrativos que caracterizaram o estilo românico, acentuando-se a preferência por decorações parietais com base em tapeçarias ou esculturas. Por esta razão, a pintura sobre tábua ou o grande fresco parietal, aplicado nos salões das residências nobres, tornaram-se nos géneros pictóricos com maior divulgação e desenvolvimento.
As pinturas sobre madeira, geralmente de temática religiosa, eram muitas vezes organizadas em conjuntos, formando polípticos. Destes os mais divulgados foram os trípticos, formados por um painel central quadrado e por dois elementos laterais que se fechavam sobre ele.
Num primeiro momento, os artistas góticos, interessados em criar atmosferas mística e divinas de carácter abstractizante e irreal, não revelavam grande interesse pela representação da sensação de profundidade. Assim, os fundos das imagens eram geralmente dourados, tratados como panos lisos, o que permitia realçar as figuras e as cenas, representadas com grande pormenor.
A partir de finais do século XIII e durante a centúria seguinte, os fundos das pinturas ganham um sentido mais naturalístico. O italiano Giotto di Bondone foi o mais importante pintor do período do Gótico final. As suas pinturas e frescos tornaram-se famosos pelo grande naturalismo na representação das figuras, do claro-escuro, dos suaves modelados das vestes ondulantes e dos elementos vegetais e pela integração das personagens em espaços arquitectónicos de acentuada tridimensionalidade.
O "Políptico da Veneração" (também conhecido por "S. Vicente de Fora"), que retrata, em vários painéis, os diferentes grupos sociais do Portugal medieval, constitui um dos mais importantes conjuntos pictóricos da história da arte portuguesa. A sua autoria, envolvida em grande polémica, é geralmente atribuída ao pintor Nuno Gonçalves, cuja obra alcançou um grande nível artístico.
Dentro do campo das artes decorativas ou aplicadas, a Iluminura conheceu, na época gótica, simultaneamente o seu paroxismo e ocaso, derrotada no século XV com a divulgação da imprensa e a expansão da gravura. De entre os principais centros artísticos de produção e exportação de manuscritos iluminados salientavam-se as ricas cidades comerciais flamengas, como Gant e Bruges. Estes manuscritos, de carácter religioso ou profano, eram realizados por encomenda e continham, para além dos textos, elementos decorativos ou (como por exemplo as caprichosas letras de início de página e as molduras com motivos geométricos ou vegetalistas) narrativos (ilustrações pintadas geralmente em páginas inteiras). Um dos mais interessantes manuscritos iluminados realizados neste período foi o famoso livro de horas do duque de Berry "Les Très Riches Heures" realizado pelos irmãos Limbourg no século XV.
Um género que conhece grande divulgação e desenvolvimento nesta altura é o vitral. Respondia às necessidades de encerrar os enormes vãos abertos nas paredes dos templos criando uma superfície translúcida e luminosa de acentuada imaterialidade que pudesse acentuar o sentido etéreo e místico do próprio espaço arquitectónico. O vitral era formado por pedaços de vidro colorido unidos por fios de chumbo, podendo formar imagens figurativas ou abstractas.
Em Portugal
Em Portugal, a utilização dos novos suportes, das nervuras ou ogivas góticas, surge já em edifícios do século XII, com soluções pontuais de compromisso com o estilo anterior (primitiva abóbada de S. João de Tarouca; Póvoa de Lanhoso). Os exemplos góticos, se exceptuarmos o caso de Alcobaça, da Batalha e da Sé de Évora, são normalmente de pequenas dimensões e recorrem a estruturas românicas (não necessitando portanto de arcobotantes), de exterior marcadamente horizontal. As cabeceiras e capelas-mores foram objecto de um maior enriquecimento e arrojo técnico, sendo normalmente o corpo destituído de abobadamento. A aparente singeleza e modéstia dos templos portugueses é um pouco reflexo da sociedade que albergavam - de facto, a Batalha, dotada das suas agulhas, pináculos e flechas, surge isolada no panorama português.
O primeiro edifício plenamente gótico em Portugal data do século XII (1178). O Mosteiro de Alcobaça, embora seja fruto de uma importação estilística, foi responsável pela introdução pontual da nova linguagem ao contribuir para a formação dos seus interlocutores.
O estilo gótico consolida-se após a crise de 1190-1250, numa cronologia quase paralela ao reinado de D. Afonso III (1245-1279), que assiste à unificação e estabilização da nação após a conquista do Sul - Lisboa, Santarém e seus arredores polarizam as empreitadas. Iniciam-se empreendimentos como S. João de Alporão (Santarém) e Santa Maria do Olival (Tomar), surgindo também estaleiros de referência (Sé de Évora), e os grandes mosteiros mendicantes iniciam obras.
Com D. Dinis (1279-1325), prolongam-se e concluem-se as obras dos ditos conventos e a arquitectura militar é impulsionada. Alcobaça é dotada de um claustro, tal como a Sé lisboeta e, Coimbra, Tavira e Vila do Conde vêem nascer os seus conventos. D. Afonso IV (1325-1357) assiste à edificação da abside da Sé de Lisboa e D. Fernando (1367-1383) faz novamente uma inflexão face à arquitectura militar. É com D. João I (1383-1433) que surge o período final do gótico português - o imenso estaleiro da Batalha que se irá eternizar. Há uma continuação das obras que os tempos de crise forçaram a parar, surgindo mesmo novas iniciativas régias (claustro da Sé do Porto; catedrais da Guarda e de Silves, e Colegiada de Guimarães).
Esta "arte nova", reflexo de uma construção ideológica complexa, afirma-se lentamente, ainda que com soluções de compromisso, tal como a sociedade que a viu nascer se vai libertando do corporativismo feudal. O crescimento urbano dinamiza a vida comunal, a sociedade enriquece e as encomendas proliferam, contribuindo para um enriquecimento dos templos. Estes, imbuídos duma nova vivência religiosa, abrem-se aos crentes na glorificação do mistério cristológico.
Como referenciar este artigo:
Gótico. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2009. [Consult. 2009-03-20].
Introdução
Desvalorizado enquanto criação artística pelos humanistas da Renascença, defensores dum classicismo italianizante que reviam no Gótico a maniera tedesca (germânica) ou a maniera dei goti (dos bárbaros), esta arte medieval foi reabilitada a partir do século XVIII, emergindo, ainda que com algumas hesitações, das "Trevas" a que estava associada.
Esta arte, que se desenvolve na Europa entre os séculos XII e XV, nasceu na Ilha de França (Paris), na Catedral de Sens (1130-1162) e na Abadia de St. Denis (1130-1144), expandindo-se depois a outras regiões. O abade Suger aparece como o grande mentor da renovação estética e ideológica do Gótico, ao realizar uma série de intenções programáticas em St. Denis, imbuídas do enquadramento escolástico e das interpretações neoplatónicas. Este sistema de pensamento faz-se corresponder numa arte onde o Mistério da Luz teoriza e fundamenta a própria concepção espacial, ao serviço duma fé aglutinadora e poderosa. Trata-se da "estética da elevação espiritual" que este estilo eterniza, mas a sua originalidade não se resume aos princípios ideológicos.
Arquitectura
Durante a época gótica, a arquitectura, simbolizada pela grande Catedral, foi a forma artística que conheceu um maior desenvolvimento técnico e formal. Grande parte das criações escultóricas deste período surgem associadas à arquitectura (normalmente de carácter religioso), sendo aplicadas tanto no exterior como no interior dos edifícios. Procurava em simultâneo exaltar e descrer os textos sagrados, todas as esculturas da Catedral cumpriam um vasto programa narrativo que as transformou num verdadeiro "Livro de Pedra". Para além destas peças escultóricas que integravam as fachadas (caso das representações de anjos e de santos das portas, das figuras fantásticas que formavam as gárgulas, das séries de retratos de reis), ou os interiores das naves, como os capitéis esculpidos, os frisos decorados e os retábulos em pedra, foram igualmente desenvolvidas estátuas de escala mais modesta que se tornaram autónomas relativamente aos organismos arquitectónicos.
Estas esculturas, de pequena dimensão e de temática religiosa, destinavam-se ora às igrejas rurais, ora ao culto privado. A partir dos inícios do século XIII, momento que marcou a ascensão de uma estética mais naturalista e menos estilizada, as estátuas representando a Madonna com o menino constituíram um dos temas preferidos. Estas estátuas, tal como grande parte dos edifícios, eram pintadas.
O mosteiro da Batalha, em Portugal, apresenta um dos mais notáveis conjuntos de estatuária gótica integrada em arquitectura, assim como o grande túmulo de D. João I. Dentro deste género são de referir ainda os túmulos de D. Pedro I e de D. Inês de Castro, colocados no transepto do mosteiro de Alcobaça, que constituem o mais perfeito conjunto escultórico português da época gótica.
Tecnologicamente, o gótico define-se pela utilização concertada do arco ogival e da abóbada de nervuras cruzadas, que permitiram o arrojo de coberturas mais altas (estreitamento dos pilares) e mais leves. O uso de nervuras diagonais introduz a complexificação dos sistemas de suporte - os pilares adensam-se e concentram elementos distintos (colunelos, colunas, pilastras), recebendo a descarga imposta pelas nervuras. As paredes libertam-se das anteriores abóbadas, adelgaçam-se numa quase desmaterialização, à qual não é estranho o emprego de contrafortes exteriores separados dos panos parietais, aos quais se unem por meio de arcobotantes (arcos de descarga). Verifica-se na arquitectura gótica uma acentuada renovação espacial que nos distancia do modelo basilical, sobretudo pela verticalidade.
Os elementos de suporte complexificam-se e alongam-se e as abóbadas de cruzaria conferem unidade ao espaço. As paredes desmultiplicam-se em andares (galerias, trifório), onde a presença da luz natural contribui para a intensificação da mística religiosa. Tudo é linear, proporcional e uno, numa estreita correspondência de partes. O coro desenvolve-se de maneira por vezes excepcional, dando origem à formação de deambulatórios com as respectivas capelas radiantes, favorecendo a aproximação tangencial do crente com o seu Deus. As paredes são ritmadas por amplos janelões que transfiguram a luz através de elaborados vitrais, de vincado carácter narrativo.
A nível da planta consagra-se a adopção do plano em cruz latina, com três naves de altura e largura desiguais e transepto geralmente com três naves, embora pouco saliente.
As fachadas concentram dois elementos-chave do Gótico - o portal e a rosácea (alude ao sol como símbolo de Cristo e à rosa como símbolo de Maria) -, rivalizando entre si nas dimensões e enriquecimento escultórico.
Artes plásticas e decorativas
Na época gótica abandonou-se a tendência para pintar o interior das igrejas com os grandes ciclos narrativos que caracterizaram o estilo românico, acentuando-se a preferência por decorações parietais com base em tapeçarias ou esculturas. Por esta razão, a pintura sobre tábua ou o grande fresco parietal, aplicado nos salões das residências nobres, tornaram-se nos géneros pictóricos com maior divulgação e desenvolvimento.
As pinturas sobre madeira, geralmente de temática religiosa, eram muitas vezes organizadas em conjuntos, formando polípticos. Destes os mais divulgados foram os trípticos, formados por um painel central quadrado e por dois elementos laterais que se fechavam sobre ele.
Num primeiro momento, os artistas góticos, interessados em criar atmosferas mística e divinas de carácter abstractizante e irreal, não revelavam grande interesse pela representação da sensação de profundidade. Assim, os fundos das imagens eram geralmente dourados, tratados como panos lisos, o que permitia realçar as figuras e as cenas, representadas com grande pormenor.
A partir de finais do século XIII e durante a centúria seguinte, os fundos das pinturas ganham um sentido mais naturalístico. O italiano Giotto di Bondone foi o mais importante pintor do período do Gótico final. As suas pinturas e frescos tornaram-se famosos pelo grande naturalismo na representação das figuras, do claro-escuro, dos suaves modelados das vestes ondulantes e dos elementos vegetais e pela integração das personagens em espaços arquitectónicos de acentuada tridimensionalidade.
O "Políptico da Veneração" (também conhecido por "S. Vicente de Fora"), que retrata, em vários painéis, os diferentes grupos sociais do Portugal medieval, constitui um dos mais importantes conjuntos pictóricos da história da arte portuguesa. A sua autoria, envolvida em grande polémica, é geralmente atribuída ao pintor Nuno Gonçalves, cuja obra alcançou um grande nível artístico.
Dentro do campo das artes decorativas ou aplicadas, a Iluminura conheceu, na época gótica, simultaneamente o seu paroxismo e ocaso, derrotada no século XV com a divulgação da imprensa e a expansão da gravura. De entre os principais centros artísticos de produção e exportação de manuscritos iluminados salientavam-se as ricas cidades comerciais flamengas, como Gant e Bruges. Estes manuscritos, de carácter religioso ou profano, eram realizados por encomenda e continham, para além dos textos, elementos decorativos ou (como por exemplo as caprichosas letras de início de página e as molduras com motivos geométricos ou vegetalistas) narrativos (ilustrações pintadas geralmente em páginas inteiras). Um dos mais interessantes manuscritos iluminados realizados neste período foi o famoso livro de horas do duque de Berry "Les Très Riches Heures" realizado pelos irmãos Limbourg no século XV.
Um género que conhece grande divulgação e desenvolvimento nesta altura é o vitral. Respondia às necessidades de encerrar os enormes vãos abertos nas paredes dos templos criando uma superfície translúcida e luminosa de acentuada imaterialidade que pudesse acentuar o sentido etéreo e místico do próprio espaço arquitectónico. O vitral era formado por pedaços de vidro colorido unidos por fios de chumbo, podendo formar imagens figurativas ou abstractas.
Em Portugal
Em Portugal, a utilização dos novos suportes, das nervuras ou ogivas góticas, surge já em edifícios do século XII, com soluções pontuais de compromisso com o estilo anterior (primitiva abóbada de S. João de Tarouca; Póvoa de Lanhoso). Os exemplos góticos, se exceptuarmos o caso de Alcobaça, da Batalha e da Sé de Évora, são normalmente de pequenas dimensões e recorrem a estruturas românicas (não necessitando portanto de arcobotantes), de exterior marcadamente horizontal. As cabeceiras e capelas-mores foram objecto de um maior enriquecimento e arrojo técnico, sendo normalmente o corpo destituído de abobadamento. A aparente singeleza e modéstia dos templos portugueses é um pouco reflexo da sociedade que albergavam - de facto, a Batalha, dotada das suas agulhas, pináculos e flechas, surge isolada no panorama português.
O primeiro edifício plenamente gótico em Portugal data do século XII (1178). O Mosteiro de Alcobaça, embora seja fruto de uma importação estilística, foi responsável pela introdução pontual da nova linguagem ao contribuir para a formação dos seus interlocutores.
O estilo gótico consolida-se após a crise de 1190-1250, numa cronologia quase paralela ao reinado de D. Afonso III (1245-1279), que assiste à unificação e estabilização da nação após a conquista do Sul - Lisboa, Santarém e seus arredores polarizam as empreitadas. Iniciam-se empreendimentos como S. João de Alporão (Santarém) e Santa Maria do Olival (Tomar), surgindo também estaleiros de referência (Sé de Évora), e os grandes mosteiros mendicantes iniciam obras.
Com D. Dinis (1279-1325), prolongam-se e concluem-se as obras dos ditos conventos e a arquitectura militar é impulsionada. Alcobaça é dotada de um claustro, tal como a Sé lisboeta e, Coimbra, Tavira e Vila do Conde vêem nascer os seus conventos. D. Afonso IV (1325-1357) assiste à edificação da abside da Sé de Lisboa e D. Fernando (1367-1383) faz novamente uma inflexão face à arquitectura militar. É com D. João I (1383-1433) que surge o período final do gótico português - o imenso estaleiro da Batalha que se irá eternizar. Há uma continuação das obras que os tempos de crise forçaram a parar, surgindo mesmo novas iniciativas régias (claustro da Sé do Porto; catedrais da Guarda e de Silves, e Colegiada de Guimarães).
Esta "arte nova", reflexo de uma construção ideológica complexa, afirma-se lentamente, ainda que com soluções de compromisso, tal como a sociedade que a viu nascer se vai libertando do corporativismo feudal. O crescimento urbano dinamiza a vida comunal, a sociedade enriquece e as encomendas proliferam, contribuindo para um enriquecimento dos templos. Estes, imbuídos duma nova vivência religiosa, abrem-se aos crentes na glorificação do mistério cristológico.
Como referenciar este artigo:
Gótico. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2009. [Consult. 2009-03-20].
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